sábado, 10 de novembro de 2012

MEU BAIRTO QUERIDO - SÉ


A Praça da Sé já foi um bairro como outro qualquer. Tinha quatro quarteirões de casas e uma igreja, aliás, uma senhora igreja, nada mais nada menos que a Catedral de Salvador. Chamava-se Igreja da Sé.
Vista de Salvador nos anos de 1930- A sinalização vermelha - uma nuvem - sinaliza o Bairro da Sé, entre a Igreja da Sé (que foi Catedral e a atual Catedral no Terreiro de Jesus),
Há de se reparar que os prédios eram de dois e três andares. Como os hoje existentes no Pelourinho.

A Igreja da Sé à direita tem a frente voltada para o mar. A atual catedral tem os fundos para esse mesmo mar. Uma questão posicional.

Ai um belo dia, acharam por bem acabar com tudo. Sim! Isto mesmo! Acabar mesmo, derrubar todos os prédios e a própria Catedral, para que no local pudessem ser instaladas centenas de metros de trilhos por onde circularia os bondes das Linhas Circular de Carris da Bahia. Era escrito assim mesmo “Linhas Circular” – português de estrangeiro. Decorria o ano de 1933.
A população como um todo protestou, a imprensa, os moradores, o povo de um modo geral. Mas não adiantou. Àquele tempo, não adiantava protestar. Eram ordens imperativas iguais aquelas que ordenaram o bombardeio de Salvador a partir dos fortes São Marcelo, Barbalho e Santo Antônio.  Bombardeio mesmo que provocou a destruição do Palácio do Governo e incendiou muitos edifícios. Vale lembrar que àquele tempo a população na sua maior parte, morava nas redondezas, mas como houve um aviso de que o bombardeio começaria em determinado dia e hora, as pessoas puderam sair de suas casas e se mandar para o interior, para as ilhas, recôncavo, casa de parentes fora da área de perigo, etc.
Faziam o que queriam e dava na venta, segundo conhecida expressão popular. Outro exemplo desta imperaliedade foi o aterro do porto de Salvador. Botaram abaixo mais da metade dos imóveis então existentes no bairro do Comércio. Só deixaram a hoje Rua Portugal que, na época chamava-se Rua das Princesas, bem como a Conselheiro Saraiva, continuação da Portugal e as ruas encostadas ao morro, como as ruas Conselheiro Saraiva, Santos Dumont e Campo Santo.
Mas, o porto era necessário. Sem dúvida! Mas não deveria ter seu inicio onde começou, em frente ao Forte de São Marcelo, uma área reconhecidamente rasa. Deveria ter começo mais ou menos onde era o Cais do Ouro e daí para Água de Meninos. Preservaria o bairro do Comércio. Aliás, vale lembrar que a atual ampliação do porto se faz justamente para os lados de Água de Meninos, um século depois. Motivo: a área atual é imprópria para porto- rasa e de difícil manobra devido ao forte São Marcelo. Os grandes navios têm que dar marcha-ré.
Agora, vejam o padrão das mesmas, dos seus imóveis e os senhores haverão de imaginar o desamor dessa gente.
 
Começamos com duas fotos do Cais das Amarras:
Tiveram coragem de derrubar essa preciosidade. Todos os prédios foram construídos no estilo pombalino.
 
Agora vejamos o que restou e não se diga que o que ficou tinha melhor qualidade dos prédios de frente para o mar ou mais próximo dele. Muito pelo contrário, na maioria dos casos:
LINDOS PRÉDIOS - LUXUOSOS


BOM GOSTO

CLÁSSICO
Poderriamos citar dezenas de outros prédios que se salvaram da ação do aterro do porto, em razão que estes estão mais próximos do morro. Com base nessa qualidade, não se admite que os que foram demolidos mereciam sê-lo. Fazia-se o porto mais adiante, como já se disse, e há provas técnicas para tanto.
Foi esse desamor que imperou na Praça da Sé e, segundo se sabe, contou com as bênçãos do Arcebispo da época e antecessores. Uma calamidade.
Sobre o assunto vejam o que escreveu o Professor Cid Teixeira, magnifico historiador de nossa terra:
IGREJA DA SÉ E O BAIRRO DE COSME DE FARIAS
"A igreja da Sé, ela foi demolida em 1933. Quando ela foi demolida, grandes protestos, grandes manifestações, mas não adiantou nada, não; botaram a igreja no chão. E, por iniciativa do padre Manoel Barbosa, colocou-se um busto do primeiro bispo Dom Pero Fernandes Sardinha no sitio onde estava o altar-mor da igreja da Sé. Não havia gratuidade na colocação daquele busto ali, não; o sitio estava no local onde a igreja da Sé tinha o seu altar-mor. Quando fizeram essas modificações, agora, que botaram a fonte luminosa ali, botaram Tomé de Souza com ar de treinador de time de vôlei, puseram o bispo aleatoriamente, acharam que aqui está melhor e botaram o bispo. Não perdeu o simbolismo e encomendou-se a Mario Cravo uma cruz fraturada como símbolo do arrependimento tardio por ter-se demolido a igreja da Sé. Quando se demoliu a igreja da Sé, a pedra lavrada, a cantaria talhada, toda ela, toda ela – estou ficando velho, está na hora de eu dizer isso – toda ela foi colocada num terreno de propriedade da Cúria Metropolitana, que se chamava Quinta das Beatas. Pedras de cantaria lavrada, florões de pedra, etc., foi tudo colocado ali. Um dia fizeram uma invasão na Quinta das Beatas, que era um terreno baldio e de marreta quebraram-se as cantarias todas para fazer fundação das casas da invasão, que é hoje o consolidado bairro de Cosme de Farias. Se alguém cavar uma casa em Cosme de Farias, está arriscado a encontrar uma portada de igreja, uma coisa dessas de cantaria talhada aí, na Quinta das Beatas."
Cid Teixeira
www.cidteixeira.com.br

PROTESTOS CONTRA A DEMOLIÇÃO DA IGREJA DA SÉ
“É bom que se diga a verdade, as negociações foram travadas ainda no tempo em que era arcebispo Dom Jerônimo Tomé da Silva, com a morte de Dom Jerônimo, assumiu o arcebispado Dom Augusto Álvaro da Silva que não se rendeu – vamos dizer assim – às manifestações, o que havia, a Faculdade de medicina, a Faculdade de direito, o Instituto Histórico, em resumo, as entidades mais significativas, mais culturais da cidade, protestaram, fizeram abaixo-assinados e manifestos, etc.; não obstante, foi demolida a igreja da Sé.”
Cid Teixeira
www.cidteixeira.com.br

A COMPANHIA LINHA CIRCULAR FINANCIOU A DEMOLIÇÃO DA IGREJA DA SÉ
“A Companhia Linha Circular tinha interesse em modificar o trânsito de seus bondes ali, no centro, porque com a igreja da Sé no meio. Você tem idéia de onde estava a igreja da Sé, a fachada voltada para o mar, onde está a Cruz Caída, o corpo da igreja atravessando tudo aquilo e os quarteirões todos, porque não foi só a igreja que foi derrubada, foi a igreja e todos os quarteirões ao redor. Então, a Companhia Linha Circular, que fez a sua sede ali, onde está hoje a Coelba, aquele prédio foi feito pela Circular para ser sua sede, tinha todo o empenho em derrubar e patrocinou inclusive financeiramente, é verdade. Dizem que a Sé na Misericórdia não cabe é certo, é justo; mas cabe não há discórdia no bolso de Dom Augusto.
Diziam-se uns versinhos assim na época.”
Cid Teixeira
www.cidteixeira.com.br
Vejamos a Praça da Sé hoje:

 
Séde da Cúria de Salvador
 
Praça da Sé
 
A Crua Caída
 
Ainda a Praça da Sé

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