segunda-feira, 15 de julho de 2013

PESSOAS INTERESSANTES E/OU FOLCLÓRICAS DE SALVADOR – CUICA DE SANTO AMARO

Em frente ao Elevador Lacerda na parte alta ou em frente à Câmara de Vereadores na Praça Municipal, geralmente em cima de um engradado de cerveja, atuava Cuica de Santo Amaro, o maior cordelista (literatura de Cordel) de Salvador,

Apesar do nome “de Santo Amaro” não nasceu na terra de Caetano. É natural de Salvador onde nasceu  em 1907 e morreu em 1964. Era chamado por Jorge Amado de “O Trovador da Bahia”. Outros nomes da literatura brasileira reconheceram o seu valor. Foi um mestre da cultura popular.

O Santo Amaro de seu apelido adveio de ter sido criado por uma senhora em Santo Amaro e diz-se ter a visão muito prejudicada. Morava no bairro de Quintas. Já “Cuíca”adveio do fato que num violão tirava o som de uma cuíca

Repórter popular, o poeta de cordel documentou 30 anos de crimes, desastres, escândalos sexuais e políticos da vida cotidiana baiana. Era um terror! Quando a Mulher de Brotas cortou o “principal” do marido, a Praça Municipal se encheu para ouvir seus versos a respeito. Saiu carregado!

Acompanhava de perto a política da terra, principalmente na área da Prefeitura. Tinha intenções políticas e uma vez se candidatou a vereador, mas o povo não lhe deu o merecido apoio. Fosse hoje com a irreverência  dos dias atuais e teria sido eleito. Por muito menos, Tiririca com sua graça, obteve mais de um milhão de votos; É Deputado Federal. ´Cuíca queria apenas ser vereador. Achamos que na sua inscrição de votação colocaram apenas o seu verdadeiro nome – José Gomes – ninguém conhecia essa pessoa.

Temos uma foto de um cartaz de sua propaganda. Quem poderia saber que aquela respeitável figura fosse o Cuíca de Santo Amaro. Faltou estratégia. Realidade. O povo o conhecia de outra forma. Naquela época não tinha marqueteiro. 



José Gomes


Vestia-se envolto em cartazes, chapéu de coco, calças listradas, fraque e rosa na lapela. Lembrava muito Charles Chaplin, o grande ator francês.


Cuica de Santo Amaro

Foi inspiração de personagens inseridos no Pagador de Promessas de Dias Gomes e Bahia de Todos os Santos, de Jorge Amado.

Josias Pires disse dele:

“Ele é aquilo que todo romancista queria ter criado. Personagem de mil faces, de características contraditórias. É o herói e anti-herói. Um poeta livre, das margens, popular. Era o Gregório de Matos sem gramática"

Disse mais Josias  Pires:.

“Cuíca era um sujeito muito visível. Qualquer pessoa que circulasse pela cidade tinha notícias dele, porque ele gritava poesias, livrinhos, anúncios na rua. Não se encontra ninguém que viveu aqui nos anos 1940 e 1950 e que nunca tenha visto Cuíca atuar. E a obra dele ficou muito rara, mas conseguimos reunir mais de 300 livrinhos de pesquisadores e pessoas que compraram em Salvador, Feira de Santana, Rio de Janeiro, São Paulo e Estados Unidos”, conta Josias.
Nas memórias coletadas, conta o diretor, fica também aparente o papel de 'jornalista extorquista' do poeta e comunicador de rua. Em suas crônicas de cordel, era sempre assunto a boataria dos escândalos, alvo de curiosidade dos moradores e de preocupações dos protagonistas reais daquelas tramas.

"Eram escândalos, segredos de alcovas,  traições amorosas. Tratava de muitos temas complicados, que incomodam, e que até hoje pessoas que têm amigos que sofreram com isso não querem falar. Trazia essas temáticas que se vê hoje no mundo cão da televisão, casos policiais, mães que estrangularam filha. Mas ele usava essas casos escandalosos para vender", afirma.

Mais um comentário sobre ele em forma poética:
Cuíca de Santo Amaro
Grande fidalgo baiano
Morava em São Salvador...
Um bom cronista, de faro,
Contava o cotidiano
Do coitado e do doutor...


Viveu há cinqüenta anos

Na cidade da Bahia
Que lhe rendia homenagem...
Os seus versos mais insanos
Traziam humor e alegria
E lhe abriam passagem...



Lembro o Elevador Lacerda

bem perto do meio-dia:
A multidão apressada
E gente que andava lerda
Dois minutinhos perdia
Pra ficar bem informada...



Bengala e óculo escuro

Cuíca, bem alto, lia
O seu cordel encantado...
Tinha gente sobre o muro
Que sua voz, atenta ouvia
Sobre fato consumado...



Era cego de nascença

Um cantador diferente
Que contava cada história...
Pra êle, não tinha crença
Fosse inimigo ou parente,
Que escapasse da memória...



Mulher que capou marido

Filho que matou o pai
A boazuda do patrão...
O Cuíca era inxirido
Bota pra fora o que sai
Tudo o que lhe vem à mão...



Seus livretos pendurados

No varal improvisado
Custavam o valor de um pão...
E todo o mundo queria
Participar da alegria
Que tinha em seu coração...

Ricardo De Benedictis



Seus versos virulentos assustavam poderosos e gente comum e não havia segredo guardado a sete chaves que escapasse do seu faro para escândalos que tornava públicos na cidade através de cordéis. Esse foi, ao longo da vida, o seu ganha pão. Venal para uns, genial para outros. Uma coisa, porém, ninguém nega: esta personagem do século passado mantém uma atualidade singular, que não se insere em nenhum rótulo.



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